Nascimento de uma problemática
É preciso conservar no espírito esse itinerário de um grande intelectual condottiere, que foi o primeiro dos grandes desbravadores do campo das ciências do homem e da sociedade, o criador da historia científica e da sociologia. Um itinerário que vai permitir compreender a problemática própria à reflexão khalduniana.
A África do Norte da época é uma das grandes dinastias: os Merínidas do Marrocos ( 1269-1420), os Hafçîdas da Tunísia, Nacrîdas de Granada ( até 1492), Mamelucos do Egito também ( 1250-1517). Mas a luta entre Merínidas e hafcîdas, no curso da qual Ibn khaldûn inclina-se para o refinamento cultural dos Merinidas, força-o a abandonar Túnis e a buscar inultimente uma meditação num Maghreb que se entredilecera e toma o caminho da fraqueza e, mais tarde, da decadência.
Ibn khaldûn desliga-se consequentemente das esferas exclusivamente filosóficas e éticas, para ele o problema político atinge uma tal acuidade que exige algo mais do que uma interpretação teórica ou uma exegese que se quisesse normativa. Literalmente, chegou o momento de uma abordagem radical em que o pensador se faça ator, testemunhe e lute simultaneamente para esclarecer: “Com relação a essa época, isto é, a ultima parte do século VIII uma reviravolta geral, da qual somos testemunhas, mudou o estado do Maghreb (...) . E, quando o estado de uma região muda total e radicalmente, é como se o mundo houvesse se transformando em seu conjunto e até os seus fundamentos; e é então como que uma nova criação, uma nova formação, um mundo novo que aparece. Eis por que é necessário que haja, pra essa época alguém que registre as transformações dos seres e das gerações, as mudanças dos hábitos e nos modos de vida e de pensamento, seguindo o caminho traçado por Mas’ûdî; e assim, ele se tornará um modelo que os historiadores do futuro imitarão.”
Percebe-se o que a história será nas mãos daquele que vai fazer dela uma ciência: rigor na analise do conjunto sociopolítico, de uma lado; busca dos fundamentos da racionalidade no domínio da história das sociedades humanas, de outro lado. A dialética do especifico e do universal, uma dialética voltada para a ação eficaz, única capaz de dar corpo a racionalidade histórica